sábado, 4 de dezembro de 2010

Espetáculo no cotidiano por Pollyane Belo

A ficcionalização da realidade solidifica a presença de personagens encorporados pelo sujeito ordinário. O isolamento seria a única via para desvincular a performance cotidiana do indivíduo comum. Uma estratégia para a construção dessa personalidade alterdirigida é a confissão, idéia desenvolvida por Focault. Através do ato confessional o personagem exerce o poder da gestão de si mesmo, a possibilidade de se edificar por meio da perspectiva do outro, podendo sofrer represálias, adquirir o perdão ou criar um estreitamento permeado por compaixão.

Ao se comparar este personagem com as celebridades essa visão se torna evidentemente mais radical. Não importa o espaço, majoritariamente, estão sendo perseguidos por lentes fotográficas prontas para enquadrá-los em um momento mais embaraçoso ou íntimo. No momento que ele puder ser clicado, será. As reclamações por parte destes são inúmeras com relação à exposição de um momento que não condiz com a sua concepção da esfera privada, baseadas em argumentos claros de só concederem sua imagem para o ambiente público, ou seja a presença nos meios de comunicação com autorização prévia. Contudo, a mídia naturalizou o estado público-integral do famoso, não distinguindo o limite entre o que é conveniente a cada esfera. Este fato contemporâneo é confuso até para a exposição dos anônimos feita através de redes socias.

Entretando, e se essa exposição for autorizada? Divergindo da lógica de colunas em sites e revistas, exclusivas para as vidas desses agentes explicitadas sem cautela, existe o projeto One Day in The Life Of..., uma proposta do fotógrafo Tim Hailand de revelar o cotidiano de figuras conhecidas, porém com um viés mais artístico. A idéia inicial é de passar um dia completo com o indivíduo e registrar todos os momentos (ou os mais condizentes com o objetivo do trabalho), e logo após transformar o material resultante dessas 24 horas em um livro fotográfico. Nessas obras suscitam-se os papéis equalizadores com o homem ordinário, ou seja, esses indivíduos encontram-se no mesmo patamar da pessoa comum, além de haver um estreitamento na identificação do consumidor com o sujeito ali retratado, já que ações simples de seu cotidiano foram representadas, tarefas que qualquer um realiza.

Vale elucidar a cristallização do espetáculo constituída pela comercialização desse produto, e consequentemente na compra do mesmo por esse consumidor ávido por fotos únicas de seu artista estimado, é um privilégio. E o que faz o sujeito comum conseguir sua performance pública ser reconhecida e admirada? Ele reapropria esses códigos espetaculares à sua realidade e os disponibiliza em locais possíveis para uma resposta. A visibilidade, não importa como se obtenha, constitui a certeza da existência.



Obs.: Daniel Radcliffe é o protagonista da série de filmes Harry Potter.

sites:

One Day in The Life Of Project


Perfil de spasmisk na rede social Deviantart, onde a mesma posta seus trabalhos amadores

Nenhum comentário: