sábado, 4 de dezembro de 2010

Vamos falar de sexo?: papo calcinha e as técnicas da confissão por Nayara Matos


Nos últimos séculos assistimos a mudança no mapa subjetivo dos sujeitos. Acompanhando tais mudanças um novo fenômeno emerge: a exibição da intimidade. As ferramentas midiáticas acabam por se tornar grande proporcionadores e facilitadores dessa nova experiência de expor a intimidade. Observa-se que as técnicas da confissão acabam por perdurar e ganhar uma nova tematização na contemporaneidade. Antes de apontarmos algumas peculiaridades dessa nova maneira de confessar, é necessário que se faça um breve recuo no tempo.

Michel Foucault identifica no século XIX duas maneiras de se extrais as verdades dos sujeitos, mais especificamente as verdades sobre o sexo. Uma primeira técnica para se extrair a verdade do sexo é chamada pelo filósofo de ars erotica. Tal prática procurar retirar do próprio prazer as verdades sobre o sexo. O prazer é tipo como experiência individual não havendo portanto nenhuma referencia absoluta a uma lei do que é permitido ou o que é permitido. O prazer deveria ser mantido na maior discrição, pois perderia sua eficácia e sua virtude caso fosse divulgado. Tal experiência só poderia ser passada adiante em rituais espiritualmente autorizados. A prática do ars erótica é comum nas sociedades orientais.

No entanto, nas sociedades ocidentais as verdades eram extraídas através dos discursos. Instala-se na sociedade moderna um dispositivo da confissão. Aparatado por instituições como a medicina, a justiça e a religião, a prática de confessar sobre si mesmo se tornou comum, e o sujeito moderno se tornou um sujeito da confissão. A confissão passou a ser no ocidente, uma das técnicas mais utilizadas para produzir os discursos de verdade. A confissão se torna um ritual que se desenrola em uma relação de poder, pois não se confessa sem a presença, ao menos virtual, de um parceiro. Com isso na era moderna a confissão se configura como uma ferramenta de saber poder. Nesse mesmo período não foi o fazer calar o dispositivo de poder mais efetivo, mas sim o fazer falar se tornou mais eficaz.

A principal questão que se coloca é, como se operam na contemporaneidade as técnicas da confissão. Hoje há uma nova tematização das técnicas de confissão, ainda assim elas se encontram presentes. Se no século XIX as confissões eram guardadas para os consultórios médicos e escondidos em diários secretos, hoje opera um outro regime. A principal mudança é que hoje tais confissões são públicas, são confissões alterdirigidas. Hoje além de ser necessário falar de si, é preciso fazer com isso este “falar de si” seja o mais visível possível. Um ótimo exemplo dessa confissão em massa, ou seja, para um publico cada vez maior, é o programa “Papo Calcinha” exibido pelo canal Multishow. O programa reúne quatro jovens mulheres para falar de suas experiências sexuais abertamente. Elas discutem questões associadas ao universo feminino transa no primeiro encontro, se usam vibradores ou qualquer outro acessório, se gostam de sexo anal, o que fazer quando um homem brocha, se o tamanho do pênis é importante para elas, se sentem orgasmo, aonde gostam de serem acariciadas, e muito mais. Porem o que mais chama a atenção é o teor intimo dos “papos”. Cada uma conta a sua própria e real experiência. Fica claro a relação que é estabelecida com as técnicas da confissão. O próprio canal, ao divulgar a primeira temporada do programa, o descreveu como: “um programa que faz uma revolução nada silenciosa. Ao longo dos programas, apresentadoras e convidados fazem confissões e falam sobre sexo abertamente, tirando dúvidas e contando histórias pessoais.”



Sintomático da nossa sociedade contemporânea, o programa traz personagens moldados ao gosto da mídia, atendendo de alguma forma demandas geradas pela própria construção subjetiva que fazemos parte. Para quem quiser ouvir toda e qualquer confissão de Pietra e Luhanna (as “protagonistas” apresentadoras principais do programa) é só acessar o site oficial: Papo Calcinha

Sim, mais um detalhe, só para arrematar a espetacularização em volta na vida sexual das meninas, as duas apresentadoras também podem ser vistas em um ensaio sensual para o site paparazzo. Uma revolução nada silenciosa que, como não poderia deixar de ser, esta rendendo frutos para as diversas engrenagens na mídia.

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